domingo, 31 de julho de 2011

Dante

Aí, de repente, você foge de casa e eu fico te esperando. Eu tinha que te dar outro banho, você voltava sempre sujinho da rua, com aqueles olhinhos  de jabuticaba, tão pretinhos, tão pequenos. Você era pequenino também, e tão bravinho, pensou que tinha virado adulto! Ora, você era um bebezinho que latia, mordia muito forte, lambia. Engraçado que esses dias você me lambia tanto, parecia um prenúncio da despedida, parecia que você sabia que ia me abandonar de repente. Sua mordida aquele dia nem doeu e eu preferia que você me rasgasse a pele, eu preferia isso a você ir embora.

Meu pequeno, quem te atropelou devia ter, pelo menos, o caráter de procurar seus donos, já que todo mundo te conhecia nessa cidade tão pequena. Devia, pelo menos, pedir desculpas, dizer que foi um acidente... Mas, quem disse que caráter está em voga? Bom caráter, hoje em dia, é uma raridade, ainda mais com relação aos animais.

Eu fico agoniada em saber que você sofreu, em saber que demoramos uma semana pra achar você, em saber que sua cabecinha estava tão machucada... Cada lágrima não ameniza essa agonia... E eu que já sei que não sei perder... Perder quem a gente quer por perto, então... cada perda é um vazio que rasga o peito.

Meu pequeno, essas palavras são para mim mesma, são válvulas de escape. No meio desse stress e das cobranças, no meio dessa vida atribulada, eu queria estar em casa, sentar na varanda e deixar você chegar perto, vale até a provável mordida! Eu que bem sei a falta que a falta faz... Já sinto aqui a saudade, a palavra que não tem tradução e que dói tanto... a palavra que dói...

Que São Francisco de Assis, protetor dos animais, proteja você!

[...] fazei que eu procure mais consolar, que ser consolado. Compreender, que ser compreendido. Amar, que ser amado...
[Trecho da oração de São Francisco de Assis]


Olhinhos de jabuticada, as patinhas branquinhas. Quanta saudade vou sentir, mais do que já sinto!
“O que eu nunca pensei é que pudesse ser assim tão vazia a casa sem um anjo…” [C. F. Abreu]

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